quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Hiperactivo ou Irrequieto?

Não raras vezes estes dois conceitos são confundidos e num crescente alucinante crianças irrequietas são medicadas, facilitando sem, dúvida, a tarefa a pais, professores e educadores
mas compromento muitas vezes o desenvolvimento saudável destas crianças. Tudo em prol do Bom Comportamentoe da Educação, claro!
A Irrequietude Motora designa uma actividade marcada, com uma quantidade excessiva de movimentos, sem ter uma implicação de patologia;
A Hiperactividade, aplica-se a diversos tipos de comportamento mal organizado, onde domina uma combinação de irrequietude e desatenção, inadequada para a idade, com maior intensidade e gravidade dos sintomas.
Como defende João dos Santos, a irrequietude seria uma forma de reacção contra a ansiedade, e surge, muitas vezes de um fundo de depressão.
A criança, incapaz de pensar o sofrimento, utiliza o comportamento como forma de descarga. Age em vez de pensar.
O sintoma psicomotor inicial seria o sinal de uma tentativa de adaptação ao que exigem dela, um pedido de atenção ao seu sofrimento.
A instabilidade tem sempre a ver com uma espécie de fuga para a frente. Há qualquer coisa que leva a criança a não poder estar quieta, calada, silenciosa, a evitar pensar nos fantasmas mais ligados à realidade anterior.
A instabilidade seria, de algum modo, a procura da “estabilidade” de uma idade anterior, “ e, portanto, uma tentativa de “cura” da ansiedade a que conduz a insegurança”.(João dos Santos, 2002)
De acordo com a escola Francesa, a problemática comum mais profunda situar-se-ia, numa carência no plano das interiorizações, e numa fragilidade
no plano das identificações sexuais ( Salgueiro, 2002)
Malarrive e Bourgeois( 1976, cit. por Salgueiro, 2002), encontraram nas crianças hiperactivas distorções precoces na relação mãe-bebé.
A instabilidade remete para uma relação precoce frágil em que a criança não se pôde estruturar psiquicamente, construindo um “self” frágil com “objectos internos” frágeis. (Berger, 2001; Salgueiro, 2002).
São as marcas desse vivido precoce que perseguem a criança no seu interior, não lhe permitindo qualquer descanso (segurança).
A terapêutica essencial a instituir nas crianças irrequietas deverá consistir numa perspectiva sistémica, ou seja, em todas os sistemas em que a criança se encontra inserida (família, escola).
A intervenção deve incidir sobretudo na família e escola, que deverão garantir à criança estabilidade e segurança.
Com a família, importa sobretudo modular a relação pais-filhos, tornando-a menos inquieta, mais organizadora e afectivamente mais rica e contentora.
A escola deverá ajudar a criança a pensar melhor, criando situações de aprendizagem serenas e interessantes.
O tratamento/ acompanhamento destas crianças deve ser regular, contínuo e a longo prazo.


O tratamento farmacológico ?
A Irrequietude não necessita de ser medicada, a Hiperactividade deverá ser avaliada com cuidado e só após a decisão, devendo apenas ser admnistrada em casos graves.
De acordo com Pedro Strecht assistimos, hoje em dia, a um aumento de crianças desnecessariamente medicadas.
Mais medicadas, não, necessariamente, melhor tratadas, porque ficará por perceber é que a hiperactividade e défice de atenção são meros sinais e sintomas.
Corre-se o risco de tratar sintomas ou doenças e esquecer crianças ou doentes.
Como refere Strecht , a principal tarefa perante uma criança hiperactiva é sempre compreender a origem, o porquê, os significados latentes, desses mesmos sintomas.
Medicar sem compreender é como pôr a chupeta a um bebé sem perceber porque chora.
Não é melhor ver porque chora? Se é fome ou cólicas intestinais?

Voltando à nossa questão: A prescrição da medicação deve ser bastante moderada, devido aos riscos que lhes estão associados .
Taylor ( 1986, cit. por Salgueiro, 2002) num estudo que realizou, com crianças hiperactivas observou que os psicofármacos podem ter efeitos secundários importantes em certas crianças, tais como:
Atraso no crescimento e perda de apetite (mais frequentes) Crises convulsivas, taquicardia, hipertensão, agravamento de tiques, estados disfóricos (menos frequentes).
Desta forma, e como defende Berger (2001), a medicação pode ser prescrita de forma bem moderada, supervisionada regularmente, nas seguintes condições:
Quando a criança corre risco de exclusão escolar ou familiar em virtude do seu comportamento.
Quando existe um desafio cognitivo imediato, com risco de retenção para a criança, ou quando esta não consegue aprender devido à falta de atenção.
Porém, sempre, e em simultâneo, a criança deve seguir um tratamento psicoterapêutico.

“Por detrás do que se vê, existe qualquer coisa de mais profundo, menos fácil, um lado lunar, mas infinitamente mais bonito e poético do que a própria vida afinal.
Esquecê-lo é ignorar. Descobri-lo é dar.
Como quem entende os silêncios do que não é dito.
Como quem sabe o que se estrutura para além de uma fachada.
Fala através de ti, com o pedaço de criança que ainda tiveres vivo, e verás o que elas te dizem. Também aí as crianças só falam do que estivermos preparados para ouvir.
Talvez por isto se vejam cada vez mais crianças a quem é colocado o rótulo de hiperactividade com défice de atenção
(Strecht, 2005)

3 comentários:

  1. Cara amiga e colega, benvinda á blogosfera. Mais um espaço em que se divulga a psicologia clinica e a psicoterapia, uma arte tão valiosa e que é tão pouco divulgada.

    Abraço

    Lidia

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  2. Estimada Amiga:
    Admiro a sua entrega a uma profissão magistral de entendimento da mente humana. Às vezes, a sua actuação é imprescindível. Necessária.
    Tem um valor fabuloso. Sensível. Lindo.
    Admiro o que "faz" ao Mundo inteiro.
    Adorei!
    Na minha profissão de Professor faziam falta pessoas gigantes com o seu sentir.
    Os alunos são "vidros" e, se se "partem", ou se o "partem", indevidamente...?
    Uma extraordinária dedicação e solidariedade.
    Bem-Haja!
    Beijinhos de respeito e estima enormes
    Maravilhado...

    pena

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  3. sou psicologa recem formada e agradeço imensamente sua preciosa contribuiçao ao conhecimento tansmitido com tanta alma Muito me tocou a profundidade do seu sentir.Um abraço carinhoso.Magdala

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